É pueril acreditar que o descumprimento de leis pode ser barrado por novas leis que serão interpretadas pela própria Corte, escreve André Marsiglia
Tem se tornado recorrente congressistas elaborarem e, em alguns casos, aprovarem PECs (Propostas de Emenda à Constituição) com o intuito de frear abusos do STF (Supremo Tribunal Federal).
Em 4 de novembro, foi aprovada uma PEC para impedir que o Supremo interfira nos demais Poderes por meio de decisões monocráticas. Nos últimos dias, foi anunciada uma PEC para inutilizar a decisão do STF que responsabiliza a imprensa por declarações de seus entrevistados.
PECs não solucionam a questão. Não bastam. Chega a ser pueril acreditar que o descumprimento de leis possa ser barrado pela criação de leis que serão interpretadas –adivinhem!– pelo próprio STF.
Não estamos lidando com um mero desajuste funcional, mas com um tribunal que abertamente se enfiou no meio da política nacional e que não quer mais sair. Estamos diante de um gênio que não retorna à lâmpada por ter descoberto como é desfrutável a vida fora dela.
Decidir monocraticamente sobre toda e qualquer coisa é exercer um poder imenso dentro do país. Tornar a imprensa responsável pelo que dizem seus entrevistados é facultar à Corte a possibilidade de colocar uma mordaça no jornalismo investigativo que, para monitorar e vigiar os Poderes da República, alimenta-se de fontes e entrevistas.
Se o Legislativo pretende levar a sério sua missão constitucional de frear abusos do STF, terá de fazer mais do que leis. Terá de zelar por elas, assegurar que não sejam alvo de manobra interpretativa capaz de desqualificar seu sentido original. E, sobretudo, fiscalizar o Judiciário com coragem. É a postura insubmissa do Congresso que assusta os ministros, motivando suas reações duras e seus recados na imprensa. O receio da Corte é que passe a existir no país um Congresso que saia debaixo de suas saias.
Espero que a atitude combativa do Legislativo seja mais do que um mero voo de galinha, coroado por apertos de mãos entre poderosos enfiados nos sofás de confortáveis gabinetes atapetados. Espero também que não seja mera propaganda oportunista de políticos que já estão de olho no ano eleitoral que se avizinha. Do contrário, seguiremos por mais um bom tempo com nossas liberdades jogadas na lata do lixo.